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Ney Moura Teles

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Serial Killer: um milênio, um século de prisão ou menos de trinta anos?

A prisão de Tiago Henrique Gomes da Rocha, suspeito de ser o serial killer, em Goiânia, que teria cometido até 39 homicídios, num período compreendido entre um ou até dois anos, conduz a algumas indagações. Não pretendo aqui discutir os motivos dos crimes, nem se o indiciado é psicopata. Esses temas ficam para o próximo post.

Se cometeu 39 homicídios, qualificados por dificultar ou impedir a defesa das vítimas ou por motivo fútil ou torpe, tem-se que a pena de reclusão para cada delito será fixada dentro do intervalo de 20 a 30 anos.

Imaginando-se que venha a ser condenado por todos esses crimes – desde, é óbvio, que haja prova robusta da autoria e das circunstâncias qualificadoras -, sua pena pode chegar até 1.170 anos de reclusão se receber pena máxima para cada um dos homicídios, e se se aplicar a regra do concurso material de crimes.

Seriam, mesmo, crimes cometidos em concurso material?

Ou poder-se-ia aplicar a regra do crime continuado ou continuidade delitiva, que, segundo a regra do parágrafo único do art. 71 do Código Penal, manda aplicar a pena de um só dos crimes, aumentada até o triplo?

Nesse caso, a pena máxima seria de 90 anos de reclusão?

A mínima para todos os crimes qualificados, pelo mesmo critério, poderia atingir até menos de 30 anos?

Quais os critérios para o aumento? A quantidade de crimes?

Faria alguma diferença ser condenado a 1.170 ou a 90 anos de reclusão, se é certo, que, tendo hoje 26 anos, não viverá o suficiente para expiar a pena?

Mas, se viesse a ser condenado a menos de 30 anos, a progressão seria possível?

Quais consequências adviriam de condenações tão distintas? Teria direito à progressão do regime de cumprimento da pena? Quando? Em quais circunstâncias?

Antes de pensar em penas, é preciso perguntar: teria havido, mesmo, crime continuado?

Se não houver dúvidas de que teriam sido, mesmo, 39 condutas distintas, com a mesma quantidade de homicídios, que são todos crimes da mesma espécie, poder-se-ia indagar se houve o que a doutrina chama de nexo de continuidade entre todos os crimes.

Esse nexo se materializa por meio de certa homogeneidade das circunstâncias de natureza objetiva, relativas ao tempo, lugar, maneira de execução e outras condições assemelhadas.

O lugar é a mesma cidade, Goiânia. Basta que seja na mesma cidade, considerando ser uma metrópole?

A maneira de execução parece homogênea, mas isso depende da análise de todos os casos, de per si, com todas as suas características e todas as circunstâncias, para se concluir pela presença da necessária e indispensável homogeneidade. Pelo que se lê na imprensa, parece, mas nem tudo que parece, é.

E o tempo? Um ano, dois anos, três anos? Não se sabe ainda com certeza.

Seria possível reconhecer a continuidade delitiva em 39 crimes que ocorrem durante o período de três anos?

A maneira de execução, igualmente, deve guardar razoável homogeneidade.

Crimes com modus operandi idêntico, mas cometido contra vítimas com perfis diferentes, podem ser considerados continuação do primeiro?

Crimes contra mulheres podem ser considerados continuação de uma série de crimes contra moradores de rua?

E se tiver havido alternância? A série deve ser concluída, para, só depois, ser considerada iniciada uma nova?

É possível que haja duas ou mais séries desses 39 homicídios, distintas, de modo a se reconhecer duas ou três séries de crimes continuados? E se assim for, cada série será considerada em concurso material com a série seguinte?

Ou poder-se-á reconhecer uma continuidade delitiva de duas séries distintas de crimes continuados?

Duas hipóteses: uma série de crimes contra vítimas mulheres e uma segunda série de crimes contra moradores de rua. Penas individualizadas para cada série, e depois somadas? Ou as duas séries devem ser consideradas como uma continuidade delitiva de séries de crimes continuados?

E os demais crimes não reconhecidos homogêneos em nenhuma dessas séries? Podem ser reconhecidos como série de crimes contra vítimas aleatoriamente escolhidas?

E os desígnios?

Como se vê, os temas da eventual fixação da pena desse apontado serial killer de Goiânia não são de fácil solução. Instigam. Impõem muita reflexão.

Somente após a conclusão de todos os processos é que se chegará a um porto seguro.

Mas, além da análise da prova, é preciso, antes, conhecer os institutos do Direito Penal indispensáveis a equação de todas as dificuldades.

Recomendo, para isso, a leitura dos livros abaixo, que se encontram disponíveis para download na iBookstore, nos seguintes links:

TEORIA GERAL DO CRIME – http://goo.gl/KsI3HM
DOSIMETRIA DA PENA – http://goo.gl/TviOww

Ney Moura Teles é advogado, formado, em 1984, pela Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, da USP. É professor licenciado de Direito Penal do UniCEUB (Centro Universitário de Brasília). Ministrou as disciplinas de Direito Penal I e Direito Penal III. É autor de “Direito Penal”, publicado originalmente pela LED – Editora de Direito, e depois pela Editora Atlas, e adotado em inúmeras faculdades de Direito do país. Foi professor na Escola Superior da Magistratura do Estado de Goiás, na Escola Superior de Magistratura do Distrito Federal e no Instituto Processus, em Brasília.

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